quarta-feira, 3 de setembro de 2014

A Mulher e Nietzsche

A Mulher, segundo o evangelho, é a Fonte de todos os Males: a Ciência
Será que alguém entendeu com clareza a famosa história que se encontra no início da bíblia— do terror mortal de Deus perante a ciência?... Ninguém, de fato, a compreendeu. Esse livro sacerdotal ‘par excellence’ começa, como convém, com grande dificuldade interior do sacerdote: ele se defronta apenas com um único perigo; “ergo”(Do Latim, “Portanto”), “Deus” se defronta apenas com um grande perigo.
O Velho Deus, totalmente “espírito”, totalmente sumo sacerdote, totalmente perfeito, está passeando em seu jardim: está entediado e tenta matar o tempo. Até mesmo os deuses lutam em vão contra o tédio. O que faz ele? Cria o homem— e o homem é divertido... Mas percebe que o homem também fica entediado. A misericórdia de Deus para a única necessidade presente em todos os paraísos desconhece limites: ele imediatamente cria outros animais. O primeiro engano de Deus: para o homem, esses outros animais não eram motivos de diversão— ele buscou domina-los; ele próprio não desejava ser um “animal”.— Deus então criou a mulher. Ao faze-lo, cessou o tédio do homem— e também muitas outras coisas! A mulher foi o segundo erro de Deus. “A mulher é, no fundo, uma serpente, Eva”— todo sacerdote sabe isso; “pela mulher vêm todos os males do mundo”— todo sacerdote também sabe isso. “Ergo”, ela é também culpada pela ciência... Foi somente pelo intermédio da mulher que o homem aprendeu a saborear a árvore do conhecimento.— O que aconteceu? O velho Deus foi acometido por um terror mortal. O próprio homem se tornara o seu maior erro; criara um rival de si mesmo; “a ciência iguala o homem a Deus”— e tudo acaba para os sacerdotes e deuses quando o homem se torna cientifico!— Moral: a ciência é proibida “per se” (Do Latim, “Por Si Só”); só ela é proibida. A ciência é o primeiro dos pecados, o germe de todos os pecados, o pecado original. Eis única moral.— “Tu não conhecerás”— o restante é decorrência disso.— O terror mortal de Deus, entretanto, não o impediu de ser astuto. Como se proteger contra a ciência? Durante muito tempo esse foi o problema capital de Deus. Resposta: afaste o homem do paraíso! A felicidade e o ócio estimulam o pensamento, e todos os pensamentos são maus pensamentos! O homem não deve pensar. E, portanto, o sacerdote inventa o sofrimento, a morte, os perigos da gravidez, todo tipo de miséria, a velhice, a decrepitude, sobretudo, a doença— que não passam de artifícios para lutar contra a ciência! Os problemas não permitem que o homem pense... Todavia— que coisa terrível!— o edifício do conhecimento começa a se elevar, invade o céu, obscurece os Deuses— o que fazer?— O velho Deus inventa a guerra; separa os povos; faz que os homens destruam-se, uns aos outros (— os sacerdotes sempre tiveram necessidade de guerra...). A guerra é— entre outras coisas— um grande estorvo à ciência!— Incrível! O conhecimento, a emancipação do domínio sacerdotal, prosperam apesar da guerra.— Então o velho Deus chega a sua decisão final: “O homem tornou-se cientifico— não existe outra solução: “é preciso afoga-lo!”
(Friedrich Wilhelm Nietzsche, in “O Anti Cristo”)


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