Uma objeção que frequentemente é lançada não é exatamente uma objeção ao anarquismo, mas sim uma objeção ao argumento moral em prol do anarquismo: dizer que o governo, na realidade, não é um monopólio coercivo.
Segundo este argumento, os cidadãos, ao aceitarem viver dentro das fronteiras de um determinado território e ao aceitarem os benefícios que o governo oferece — por exemplo, serviços policiais, jurídicos, educacionais, de saúde etc. —, estão na prática consentindo com este arranjo. Eles estão consentindo com o sistema vigente.
A ideia é a mesma de quando você vai a um restaurante e pede uma carne. Ao fazer isso, você não tem de dizer explicitamente que você está concordando em pagar por aquele carne; há simplesmente um entendimento tácito de que é isso que você fará. Ao se sentar à mesa do restaurante e pedir a carne, você está automaticamente concordando em pagar por ela.
O argumento seria o mesmo para a não-coercividade do estado. Se você reside dentro de um determinado território e aceita, por exemplo, os benefícios da proteção policial fornecida pelo estado local, então você implicitamente aceitou obedecer a todas as ordens desta organização.
Logo de cara, observe que, mesmo que este argumento fosse válido, ele ainda não resolve a questão pragmática sobre a funcionalidade deste sistema; ele não explica por que este é o melhor arranjo possível.
Mas há outros problemas com este argumento. É realmente verdade que, se eu for à propriedade de alguém, então há um consenso tácito de que, enquanto eu estiver nessa propriedade, eu tenho de seguir as regras locais. Se eu não quiser seguir as regras locais, então eu tenho de ir embora.
Ou seja, eu convido você para vir à minha casa. Quando você chega, eu abro a porta e lhe digo: para ficar aqui em casa, você tem de usar este nariz de palhaço. Isto certamente vai lhe parecer bastante estranho, mas ainda assim eu posso dizer: "Ei, é a minha casa e estas são minhas regras. Se quiser entrar, tem de ser assim". Neste caso, sendo eu o proprietário, você não pode simplesmente dizer: "Olha, eu vou entrar na sua casa, sim, e não vou usar o nariz de palhaço." Se fizesse isso, você estaria invadindo a minha propriedade e desrespeitando as leis vigentes dentro dela, as quais foram estipuladas antes da sua entrada. Isso, portanto, é algo que você não tem o direito de fazer.
Agora, imaginemos o cenário contrário. Suponha que eu vá à sua casa e lhe diga: "Você tem de usar um nariz de palhaço". Além do espanto total, sua outra provável reação será a de perguntar quando foi que você disse que concordava em ser obrigado a utilizar um nariz de palhaço dentro da sua casa. Ao que irei responder: "Ora, você se mudou para perto de mim. E eu uso nariz de palhaço na minha casa. Portanto, o simples fato de você estar morando perto de mim significa que você, de uma maneira um tanto mística e tácita, consente em também utilizar nariz de palhaço dentro da sua casa, mesmo que você não goste da ideia."
As pessoas que defendem o monopólio estatal simplesmente pegam este cenário que é evidentemente absurdo em nível local e o expandem para um nível nacional: se você está aqui, então você deu seu consentimento tácito com tudo o que se passa nele. Tais pessoas já partem da pressuposição de que o governo possui uma jurisdição legítima sobre um determinado território, de modo que quem está nele está automaticamente concordando com todas as regras vigentes.
O problema de tal raciocínio é que ele pressupõe exatamente aquilo que ele está tentando provar — no caso, que esta jurisdição sobre o território é legítima. No entanto, caso não se consiga provar que tal jurisdição é legítima, então se conclui que o governo é simplesmente apenas mais um grupo de pessoas que vive neste amplo território geográfico.
O que nos leva a outro ponto. Eu vivo em minha propriedade. Não sei bem quais são as determinações do governo em relação ao resto do país, mas sei que vivo em minha propriedade e ela pertence a mim, e não ao governo. Logo, o fato de que estou vivendo "neste país" significa que estou vivendo em uma determinada região geográfica sobre a qual o governo possui certas pretensões. Logo, a questão é: estas pretensões são legítimas? Se o objetivo é justamente provar que elas são legítimas então não é válido já partir do pressuposto de que elas são legítimas. Pressupor algo não significa comprovar sua legitimidade.
Outro problema com este argumento do contrato social implícito é que ele não deixa claro qual exatamente é o contrato. Quando vou a um restaurante e peço comida, todos sabem perfeitamente qual é o contrato. Sendo assim, neste arranjo é válido apresentar o argumento do consentimento implícito. Porém, ninguém jamais diria que você pode comprar um imóvel desta mesma maneira. Para a compra de imóveis, as regras são outras. Ninguém diz que "Você meio que concordou com a compra ao ter balançado positivamente sua cabeça quando lhe mostrei o tamanho do banheiro". Você tem de ver o que realmente está escrito no contrato. Com o que exatamente você está concordando? Um contrato não é claro se ninguém sabe exatamente quais são seus detalhes.
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