Você pode ouvir este ruído? Ele parece estar ecoando em todos os lugares agora. Alguns diriam que soa como as botas da tropa de choque marchando sobre o rosto de nossa dignidade, se mistura com o som das trombetas dos anjos pós-apocalípticos. É esse zunido, o início do fim, o trem de consequências que vem na nossa direção.
Sempre achei que um dia serei preso e torturado pelas autoridades. Sou um paranóico, tento não deixar rastros permanentes, não tenho tatuagens, não carrego marcas que me identifiquem, quero ser mais um entre os comuns, passar desapercebido. Mas ouço esse som, e partilho de outros valores, de desejos, e desses ideais de liberdade, solidariedade e igualdade. Sinto prazer apenas entre pessoas livres, daquelas que não querem dominar nem ser dominadas. São elas que trazem sentido a minha existência, não os mansos, nem os autoritários.
Se um dia sob tortura me perguntarem como tudo começou, lhes direi, foi muito antes do dia em que alguém (e pouco importa quem) coberto de riquezas, se viu no direito de ignorar os mortos de fome, velhos e crianças de rua, a vagar no seu caminho até o shopping. Bem antes de nós, outros ouviram também esse som, mas não no volume em que o ouvimos, esse clamor de liberdade que exige que refutemos toda a hipocrisia que é chamada de "paz" em uma sociedade cada dia mais dividida entre milionários e despossuídos.
É um som oco, o vazio em todos nós, ecos do desprezo que sentimos por esses que não vêem sua própria miséria como causa da miséria material dos outros. Como uma caixa de ressonância e sentido que amplifica nossa sensibilidade diante da injustiça, atiça nossa revolta contra esse tipo de indiferença. Compartilhar é por si só o benefício, busco beneficiar aos outros compartilhando minha revolta contra o silêncio frente a vergonhosa riqueza de alguns poucos que funda a miséria de bilhões.
Este som, este ruído, é como canções de guerra, canções de milhares de povos exterminados, no alvorecer desses estados nacionais, soberania regada com sangue e suor de trabalho escravo. Canções das guerras futuras nas quais eu e você, os seus e os meus, tomaremos parte, a nós resta nos tornarmos os bárbaros que derrubarão estes impérios corruptores em nome de um mundo livre.
Alguém disse que o fantasma da liberdade sempre retorna com uma faca entre os dentes, um punhal a ser cravado no peito do tirano. Somos a faca, e é a liberdade quem nos toma em seu punho. O fantasma da liberdade é discreto, quase invisível. As autoridades e os plutocratas não ouvirão seus passos, nem ouviram nossas canções até sentirem o golpe. Eles não devem saber quem somos, antes disso, seremos ocultistas. Até que seja tarde demais para eles. Então a guerra contra a tirania terá finalmente alcançado um novo patamar, um ponto em que a marcha da tropa de choque para diante das explosões dos molotov, o impacto das pedras e foge em retirada para nunca mais retornar.
Os arranha-céus podem ser derrubados, as bolsas de valores podem ser destruídas, mas nenhuma força de ordem no mundo foi capaz de abalar esse modo de ser anárquico, este senso ferido de justiça. Porque consciente ou inconscientemente ele está por todos os lugares, encontra-se em todos os cantos onde são ouvidas as canções de guerra. Sons que não ecoam por ideais, mas por formas de vida anticapitalistas! Você pode escutá-lo? Pode tomar parte nele até que chegue onde deve chegar?
sábado, 11 de outubro de 2014
Despossuídos
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